Análise da crise política: o Brasil não está só no mundo
A eleição de Lula e seu Governo colocaram em risco o objetivo permanente norte-americano de implantar políticas neoliberais em toda a América Latina e de incorporar as economias latino-americanas à sua economia, de forma subordinada. A articulação política e econômica de Lula/Kirchner/Lugo/Correa/Evo/Chavez reforçou a necessidade, para os EUA, de uma reação estratégica
- A vitória ideológica/econômica/tecnológica dos Estados Unidos sobre a União Soviética, a adesão russa ao capitalismo e a desintegração da Rússia e a adesão da RPC ao sistema de instituições econômicas liderado pelos Estados Unidos e a abertura chinesa controlada às MNCs levaram à consolidação da hegemonia política/imperial dos Estados Unidos.
- As diretrizes da política hegemônica americana são:
- induzir a adoção, por acordos bilaterais e pela imposição, por organismos “multilaterais”, dos princípios da economia neoliberal;
- manter a liderança tecnológica e controlar a difusão de tecnologia;
- induzir o desarmamento e a adesão “forçada” dos países periféricos e frágeis ao sistema militar americano;
- induzir a adoção de regimes democráticos liberais, porém de forma seletiva, não para todos Estados;
- garantir a abertura ao controle externo da mídia.
- As dimensões e as características da população e do mercado interno; de território e de recursos naturais (ampliada de forma extraordinária pela descoberta do pré-sal); a localização geográfica na área de influência americana; a capacidade empresarial do Estado e da iniciativa privada (BNDES, Petrobrás, Vale do Rio Doce, Embraer) a capacidade tecnológica em áreas de ponta (nuclear, Embrapa etc) tornariam o Brasil uma área de atuação prioritária para a política exterior americana, que articulou:
- apoio à redemocratização política controlada pelas classes hegemônicas no Brasil;
- a luta ideológica e midiática contra a política de desenvolvimento econômico e industrial que é identificada com o autoritarismo militar;
- apoio aos movimentos sociais (ONGs etc);
- retaliação contra as políticas nacionais de desenvolvimento (nuclear, informática, espacial);
- mobilização ideológica para a implantação das regras do Consenso de Washington:
- disciplina fiscal;
- redução dos gastos públicos;
- reforma tributária;
- juros de mercado;
- câmbio de mercado;
- abertura comercial;
- investimento estrangeiro sem restrição;
- privatização;
- desregulamentação econômica e trabalhista;
- direito à propriedade intelectual.
- desarmamento.
- A implantação, entusiasta e excessiva, das medidas econômicas, políticas e militares, propagadas pela academia, mídia e autoridades americanas, pelos Governos Fernando Collor/Fernando Henrique Cardoso, diante das características do subdesenvolvimento: enormes disparidades sociais, a fragilidade relativa das empresas de capital nacional, vulnerabilidade externa da sociedade contribuíram para o fracasso dessas políticas que levaram ao agravamento da concentração de renda, ao agravamento das deficiências de infraestrutura, ao aumento da violência social, acarretaram sua impopularidade e permitiram à vitória dos movimentos políticos progressistas diante dos Governos de Menem; Battle; Andres Perez; Fernando Henrique Cardoso, Sanchez de Lozada; Mesa.
- A eleição de Lula e seu Governo colocaram em risco o objetivo permanente norte-americano de implantar políticas neoliberais em toda a América Latina e de incorporar as economias latino-americanas à sua economia, de forma subordinada.
- A articulação política e econômica de Lula/Kirchner/Lugo/Correa/Evo/Chavez reforçou a necessidade, para os EUA, de uma reação estratégica.
- Os Estados Unidos, em cooperação com grupos internos em cada um desses países, iniciou campanhas de desestabilização política.
- No Brasil, esta campanha se inicia com o processo do “mensalão” e com a aceitação pelo judiciário da “doutrina” do domínio do fato, aplicado contra José Dirceu, em caráter exemplar e como possível sucessor de Lula.
- Apesar da campanha Anti-Lula e Anti-PT, os índices de popularidade do Presidente e do Partido atingiram níveis recorde e permitiram a eleição de Dilma Rousseff.
- O Governo Dilma Rousseff, sem capacidade política, aderiu gradualmente ao programa neoliberal de ajuste fiscal, de faxina ética e de contração do Estado.
- A incapacidade de articulação, de trato político e de mobilização social facilitou a articulação e o sucesso do processo de impeachment.
- De outro lado, a Operação Lava Jato, em articulação com o Departamento de Justiça americano, e com as agências de inteligência (espionagem) americanas como a NSA, a CIA, o FBI), através de procedimentos ilegais, tais como prisões arbitrárias, vazamento seletivo de delações de criminosos confessos, a desobediência ao princípio fundamental de presunção de inocência, a mobilização da opinião pública contra pessoas delatadas, colocando em risco a ordem jurídica e criando ódio na sociedade, com a conivência do STF, foi um instrumento de ataque ao Partido dos Trabalhadores contra o PT e a candidatura do Presidente Lula.
- A gradual autonomia e fanatização moralista da força tarefa de Curitiba levou a denúncias contra outros políticos, em especial do PMDB e do PSDB.
- A característica de “radicais livres” e o conflito com a Procuradoria Geral levou à investigação de Temer pela PF (também radical) e, como a PGR, aliados principalmente ao PSDB contra o PMDB.
- Os objetivos básicos das classes hegemônicas brasileiras, em estreita articulação com as classes hegemônicas norte-americanas, são:
- consolidar na legislação, de preferência na Constituição, as políticas neoliberais do Consenso de Washington;
- reduzir a possibilidade de vitória do Presidente Lula em 2018 e a vitória dos candidatos progressistas nas eleições para o Congresso;
- impedir a revisão por um novo governo das reformas conservadoras, em especial a EC95;
- reduzir a capacidade de ação externa e interna, do Estado brasileiro;
- destruir a política sul-americana de formação de um bloco regional e de inclusão no Conselho de Segurança da ONU;
- integrar o Brasil à economia americana e criar a obrigatoriedade de execução no Brasil de políticas econômicas neoliberais;
- impedir a industrialização, ainda que apenas parcialmente “autônoma”, do Brasil por empresas de capital brasileiro;
- consolidar este programa econômico ultra neoliberal através de compromissos internacionais, a começar pela adesão do Brasil à OCDE.
- Michel Temer, por imprudência, colocou em risco a credibilidade do processo de aprovação legislativa deste programa ao se deixar gravar pela PF em diálogos de natureza ilícita.
- Trata-se, agora, para as classes hegemônicas, de substituir “funcionários”, a começar por Temer, e substituir o comando do processo das reformas por “funcionários” menos envolvidos no sistema tradicional de aquisição e controle de poder político pelas classes hegemônicas, minoritárias ao extremo. (caixa 2, compra de votos, propinas a Partidos e a pessoas, nomeações na Administração, liberação de verbas)
- A decisão de afastar Michel Temer diante de gravações difíceis de refutar já foi tomada pelas classes hegemônicas, como revela o editorial de primeira página do Jornal O Globo e, portanto, do sistema Globo de Comunicação.
- A posição da Folha de São Paulo e do Estado de São Paulo refletem ainda certa ausência de consenso, porém nada significam em termos de impacto diante do poder da Globo.
- Não foi ainda decidido pelas classes hegemônicas o método de afastamento e substituição de Michel Temer:
- renúncia;
- decisão do TSE sobre a Chapa Dilma/Temer;
- processo do STF.
- Para as classes hegemônicas, a questão política essencial é evitar as eleições diretas antecipadas. Assim:
- o processo no STF seria muito longo, e permitiria a mobilização popular;
- a decisão do TSE levaria a eleições diretas, sobre o que há dúvidas;
- a solução mais viável e em tempo mais útil seria negociar com Temer sua renúncia, a “recompensa” pelos serviços prestados e sua imunidade.
- Também não foi ainda resolvida a questão do sucessor de Temer, mas o PSDB se prepara para assumir o poder e o PMDB a resistir.
- Nas eleições indiretas os mais prováveis candidatos seriam Tasso Jereissati, pelo PSDB, e Nelson Jobim, pelo PMDB.
- Os objetivos estratégicos das classes hegemônicas, que orientam e controlam seus “funcionários” no sistema político, continuam a ser os mesmos:
- acelerar a aprovação das “reformas” ultra neoliberais;
- desmoralizar Lula e o PT;
- “construir” um candidato “gestor”, apolítico, como João Doria, para 2018.
- A operação da PGR/PF serviu para afastar mais um candidato “político” como Aécio Neves, pois Serra já está na prática afastado e Alckmin será “afastado” por Doria.
- Estas classes hegemônicas contam que mesmo com a vitória de Lula em eleições diretas este se encontrará manietado pela EC95.
- Quanto mais cedo Michel Temer deixar o poder pior será para a Oposição pois sua saída acelerará a aprovação das “reformas”.
- O que interessa agora é retardar a saída de Temer, enfraquecendo e dificultar e adiar o mais possível a aprovação das “reformas”.
- A luta pelas Diretas Já é fundamental para mobilizar a militância e conscientizar a população dos efeitos dessas “reformas”.
- Realismo: a queda imediata de Temer atende aos interesses das classes hegemônicas assim como ocorreu com o afastamento de Eduardo Cunha da Presidência da Câmara.
[Artigo tirado do sitio web brasileiro Opera Mundi, do 23 de maio de 2017]