Eleições na Alemanha e as grandes manobras do eixo germano-francês

António Abreu - 26 Set 2017

Quer na Alemanha quer na França, os grandes grupos económicos e a comunicação social que domina poderão, no futuro, apostar mais na extrema-direita. E o eixo franco-alemão poderia assumir a configuração do Eixo de que todos ainda não nos esquecemos.

As eleições de ontem na Alemanha pretendem rematar o projecto anti-social do eixo franco-alemão, que se agravou na Alemanha, por acção de governos da CDU/CSU com os liberais do FDP ou os sociais-democratas do SPD, com as leis Wartz, iniciadas em 2005, e que está agora a ser testado em França com o pacote Macron.

 Merkel, que passará por dificuldades em formar governo, e Macron, fustigado nas ruas pelos trabalhadores franceses, e sofrendo uma derrota nas eleições para o Senado, vão manter o projecto caro aos grandes grupos económicos que levaram ambos ao poder e aí, para já, os sustentam, na medida em que ambos se identificam muito com eles. A forma como ambos estão projectados como grandes líderes políticos no circo mediático revela o suporte desses grandes grupos. Em ambos os países as classes médias e populares pagam o preço da ortodoxia orçamental que praticam.

 A ideia de que na Alemanha tudo vai bem e de que ela pode constituir exemplo para o resto da Europa não resiste à análise dos números. Merkel pode brandir ter o mais baixo desemprego da Europa, mas os alemães e o próprio FMI sabem – e dão conta disso – que os jovens para sobreviverem têm que ter dois ou três «empregos» por dia, em virtude dos tempos parciais de trabalho (com o correspondente corte de remunerações), que a precaridade disparou no país, que aumentam as desigualdades sociais – que já atingiram os níveis arrepiantes dos EUA –, e a parte da população a viver abaixo da pobreza, os serviços públicos e a protecção social.

 O envelhecimento da população e a possibilidade de encontrar trabalho alternativo levou os industriais a pressionar a aceitação de uma imigração, essencialmente síria forçada a sair do país pela guerra de agressão que sofreu mas que está em vias de ser vencida. Não há «humanismo» de Merkel ao aceitar imigrantes com bons níveis de formação e qualificação (as «vítimas» de Assad) que vão aceitar remunerações de trabalho mais baixas.

 Em França, Macron, seguindo o exemplo da colega alemã, chantageia: «Querem reduzir o desemprego? Então aceitem a precaridade.» As Leis do Trabalho podem cair pela base. Macron, como referimos, quer introduzir, com o seu nome, as leis Wartz que foram introduzidas na Alemanha a partir de 2005.

 Esse pacote inclui o facilitar dos despedimentos, a redução dos apoios aos desempregados, o disparar do tempo parcial de trabalho, particularmente entre as mulheres, mini-empregos mal remunerados, a degradação os serviços públicos e o deteriorar de infra-estruturas como as escolas (muitas das quais a carecerem de reabilitação), as estradas, com o risco que isso traz para passageiros e condutores, ou as pontes, sendo que em algumas os camiões já deixaram de poder passar.

 E depois os sustos e os medos são canalizados, na Alemanha, para o AfD e, na França, para a Frente Nacional… Sem dúvida que importa estar alerta, mas já os mesmos media estão a colocar ambos como cooperantes nas suas representações nas instituições…

 Na Alemanha o AfD, de extrema-direita, cresceu nos meios rurais ou desactivados industrialmente, particularmente na antiga RDA. É aí que também o Die Linke, que já era maioritário em alguns distritos, tem grande influência, mas subindo no conjunto da Alemanha. Os extremos tocam-se como alguns dizem? Não. A extrema-direita aproveita-se dos deserdados. A Esquerda recolhe o apoio dos seus, que não têm defraudado.

 Quer na Alemanha quer na França, os grandes grupos económicos e a comunicação social que domina poderão, no futuro, apostar mais na extrema-direita. E o eixo franco-alemão poderia assumir a configuração do Eixo de que todos ainda não nos esquecemos.

 Entretanto, a política das leis Wartz e do pacote Macron tentará certamente ser alargada a outros países da UE pelo actual eixo. Mas, aí, estamos nós com outras forças de esquerda e movimentos sindicais para lhes fazer frente.

 Ah! Quanto às eleições… a CDU desceu, o SPD foi ao tapete, o AfD subiu bem, os liberais tiveram oportunidade para falar mais alto, os Verdes ficaram ela por ela e o Die Linke subiu. Die Linke que tem sido silenciado por correspondentes e comentadores, mais centrados nas dificuldades e «virtualidades» da coligação «Jamaica» com os liberais e os Verdes, que já funciona nalguns estados.

 

[Artigo tirado do sitio web portugués Abril Abril, do 25 de setembro de 2017]