A aliança de Trump com esquartejadores, esquadrões da morte e assassinos de crianças: Arábia Saudita, Brasil e Israel

James Petras - 29 Out 2018

O projecto de construção imperial dos Estados Unidos está cimentado sobre bravatas, bombas e guerras comerciais. Além disso, os seus principais e mais criminosos aliados não são sempre de fiar.   Hoje em dia a Casa Branca está só e não conta com aliados que compartilhem e defendam o seu império unipolar

Introdução

 Nas últimas semanas a Casa Branca estreitou os seus laços com a versão contemporânea dos regimes mais cruéis do mundo. O presidente Trump deu por boas as explicações do “Príncipe da Morte” da Arábia Saudita, Mohamed bin Salman, que se graduou ao passar de cortar mãos e cabeças nas praças públicas a esquartejar corpos em consulados mo estrangeiro, o caso de Jamal Kashoggi.

 Por outro lado, a Casa Branca saudou calorosamente o triunfo eleitoral do candidato brasileiro à presidência Jair Bolsonaro, ardente defensor de torturadores, ditadores militares, esquadrões da morte e do livre mercado.

 O presidente Trump prosterna-se ante Israel e gaba-se dessa relação, enquanto o seu guia espiritual Benjamin Netanyahu celebra o Sabat com o assassínio e a mutilação de centenas de palestinos desarmados, especialmente jovens.

 Estes são os “aliados naturais” de Trump. Todos eles compartilham valores e interesses, embora cada um tenha o seu método pessoal para se desfazer dos cadáveres dos seus adversários e dissidentes.

 Vamos proceder a abordar o contexto político e económico geral em que actua este trio de monstros. Analisaremos as vantagens e os benefícios que levam o presidente Trump a ignorar e inclusivamente a elogiar acções que violam os valores e sensibilidades democráticas dos Estados Unidos.

 Para concluir, examinaremos as consequências e os riscos resultantes desta aceitação incondicional do trio de assassinos.

Contexto da Tripla Aliança de Trump

 Os estreitos laços do presidente Trump com os regímenes más desprezíveis do mundo partem de diversos interesses estratégicos. No caso da Arábia Saudita, estaríamos a falar das bases militares, do financiamento de mercenários e terroristas internacionais, das vendas multimilionárias de armas, dos lucros petroleiros e das alianças secretas com Israel contra Síria, Irão e Iémen.

 Com o fim de conservar as vantagens que proporciona a relação com a monarquia saudita, a Casa Branca está mais que disposta a assumir certos custos sociopolíticos.

 Os Estados Unidos estão encantados com vender armamento e proporcionar assessores à invasão genocida saudita do Iémen, que provocou a morte de milhares e a fome de milhões de iemenitas. A aliança da Casa Branca contra o Iémen proporciona poucas recompensas económicas ou vantagens políticas e tem um valor propagandístico negativo mas, à falta de outros estados clientelares poderosos na região, Washington contenta-se com o príncipe Salman, “o esquartejador”.

 Os Estados Unidos preferem ignorar o financiamento saudita aos terroristas islamitas opostos aos seus aliados na Asia (Filipinas) e Afeganistão, bem como das facções rivais na Síria e Líbia.

 Desgraçadamente, o assassínio de um colaborador simpatizante dos EUA, o jornalista do Washington Post residente nos EUA Jamal Kashoggi, obrigou o presidente Trump a iniciar um simulacro de investigação com el fim de se distanciar da mafia de Riad. Posteriormente eximiu o carniceiro bin Salman inventando uma história sobre “elementos malvados” encarregados do interrogatório (leia-se tortura) que lhe causou a morte.

 No Brasil, o presidente Trump celebrou a vitória eleitoral de um neoliberal fascista, Jair Bolsonaro, porque coincide plenamente com as suas prioridades: promete acabar com as regulações económicas e os impostos corporativos às multinacionais; é um ardente defensor da guerra económica de Trump contra Venezuela e Cuba; promete armar os direitistas esquadrões da morte e militarizar a policia; e garante secundar fielmente as políticas bélicas dos EUA no estrangeiro.

 Não obstante, Bolsonaro não pode apoiar a guerra comercial de Trump, especialmente com a China, receptora de quase 40% da agro-indústria de exportação brasileira. Isto é assim, principalmente, porque a elite da agro-indústria é um dos principais apoios, financeiros e no Congresso, de Bolsonaro.

 Se tomamos em conta a escassa influencia de Washington no resto da América Latina, o regime neofascista do Brasil converter-se-ia no principal aliado de Trump na região.

 Israel, por outro lado, é o principal mentor e chefe de operações no Próximo Oriente, para além de ser um aliado militar estratégico.

 Sob a liderança do seu primeiro-ministro Benjamin Netanyahu Israel apoderou-se e colonizou a maior parte da Cisjordânia e ocupou militarmente o resto da Palestina; encarcerou e torturou milhares de dissidentes políticos; cercou e provocou a fome de um milhão de habitantes de Gaza; e impôs condições etno-religiosas para conseguir a cidadania israelita, negando os direitos básicos a mais de 20% dos residentes árabes do suposto “Estado judeu”.

 Netanyahu bombardeou centenas de povoações, cidades, aeroportos e bases militares em apoio dos terroristas do ISIS e dos mercenários ocidentais. Israel intervém nas eleições estado-unidenses, compra os votos para o Congresso e assegurou-se que a Casa Branca reconhecesse Jerusalém como capital do Estado judeu. Os sionistas da América do Norte e Reino Unido actuam como uma quinta coluna que garante a unanimemente favorável cobertura informativa de Israel e das suas políticas de apartheid.

 O primeiro-ministro Netanyahu garante com isso o apoio financeiro e político incondicional dos Estados Unidos e o ter à sua disposição o armamento mais avançado.

 Em troca, Washington considera-se privilegiado por servir como tropa nas guerras delineadas por Israel no Iraque, Síria, Líbia, Iémen e Somália… e Israel colabora com os EUA na defesa da Arabia Saudita, Egipto e Jordânia. Netanyahu e seus aliados sionistas na Casa Branca conseguiram fazer retroceder o acordo nuclear com o Irão e impor a este país novas e mais estritas sanções económicas.

 Mas Israel tem os seus próprios planos e é capaz de desafiar a política de sanções de Trump com a Rússia e a sua guerra comercial com a China, pois está encantado com vender armamento e inovações tecnológicas a Pequim.

Para além do trio criminoso

 A aliança do regime de Trump com Arabia Saudita, Israel e Brasil não se produz apesar da sua conduta criminosa, mas em resultado da mesma. Os três estados têm um historial comprovado de cumplicidade e participação activa em todas as guerras actuais promovidas pelos Estados Unidos.

 Bolsonaro, Netanyahu e bin Salman servem de modelo para outros líderes nacionais aliados com Washington na sua cruzada de dominação mundial.

 O problema é que a este trio não basta para subscrever a decisão de Washington de “fortalecer o império”. Como já assinalámos, o trio não está completamente de acordo com as guerras comerciais iniciadas por Trump: a Arabia Saudita colabora com a Rússia na hora de fixar os preços do petróleo; Israel e Brasil fazem contratos com Pequim.

 Está claro que Washington necessita de outros aliados e clientes.

 Na Asia, a Casa Branca colocou-se outros objectivos para promover o separatismo étnico na China e anima os uigures fomentando o terrorismo islamista e a propaganda linguística. Trump apoia igualmente Taiwan mediante vendas militares e acordos diplomáticos. Washington intervém em Hong Kong apoiando os políticos separatistas e a propaganda mediática a favor da “independência”.

 Washington implementou uma estratégia de cerco militar e guerra comercial contra a China. A Casa Branca conseguiu reunir o apoio do Japão, Austrália, Nova Zelanda, Filipinas e Coreia do Sul para tomar a China como alvo a partir das bases militares dos referidos países. Contudo, por agora, não conseguiu aliados para a sua guerra comercial. Nenhum dos supostos aliados asiáticos de Trump apoia as suas sanções económicas.

 Esses países são favoráveis ao comércio e aos investimentos da China e dependem deles. Embora todos apoiem em palavras Washington e lhe proporcionem bases militares, diferem em temas tão importantes como a participação nas manobras militares em frente das costas chinesas e no boicote a Pequim.

 As iniciativas estado-unidenses com o objectivo de sancionar e submeter a Rússia confrontam-se com os acordos petroleiros e gasísticos vigentes entre Rússia, Alemanha e outros países da UE. Os lacaios tradicionais de Washington, como Grã-Bretanha ou Polonia, têm pouco peso político neste assunto.

 Mas o mais importante é que a política de sanções estado-unidense provocou uma aliança estratégica económica e militar de grande escala e a longo prazo entre Moscovo e Pequim.

 Para além disso, a aliança de Trump com o “trio de torturadores” criou divisões internas. O assassínio saudita de um jornalista residente nos EUA provocou boicotes comerciais e apelos do Congresso no sentido da tomada de represálias. Do mesmo modo, o candidato fascista do Brasil suscitou críticas liberais face ao elogio de Trump da democracia dos esquadrões da morte em Brasília.

 A oposição interna ao presidente Trump conseguiu mobilizar os meios de comunicação, o que poderia facilitar-lhe uma maioria no Congresso e uma oposição de massas a esta versão pluto-populista (populista na retorica, plutocrática na prática) da construção do império.

Conclusão

 O projecto de construção imperial dos Estados Unidos está cimentado sobre bravatas, bombas e guerras comerciais. Além disso, os seus principais e mais criminosos aliados não são sempre de fiar. Até o regabofe da bolsa de valores está a ponto de terminar. A época de sanções que servem os seus objectivos está a ficar para atrás. Os ralhetes furibundos na ONU provocam risos e embaraço.

 A economia enfrenta novas crises, e não só por causa do aumento das taxas de juro. As baixas de impostos são medidas que funcionam uma só vez: os lucros são retirados e embolsados. Um presidente Trump em recuo dar-se-á conta de que não existem aliados permanentes, apenas existem interesses permanentes.

 Hoje em dia a Casa Branca está só e não conta com aliados que compartilhem e defendam o seu império unipolar. A massa da humanidade necessita de romper com as políticas de guerras e sanções. A reconstrução dos EUA requererá a elaboração, a partir de baixo, de um poderoso movimento popular que não esteja dependente de Wall Street ou das indústrias bélicas. Um primeiro passo será romper com ambos os partidos internos e com a tripla aliança no exterior.

 

[Artigo tirado do sitio web portugués ODiario.info, do 26 de outubro de 2018]